Pesquisar este blog

sábado, 15 de junho de 2013

Anfrísio Pedro da Costa


                                                 Anfrísio e sua esposa em Aparecida do Norte, década de 1960.


Falando de Vieira, agora mais um ilustre descendente dessa terra: Anfrísio Pedro da Costa _ quem foi?
Nascido em 1902, no 2° distrito de Teresópolis, Vargem Grande; filho de Manoel Pedro da Costa e Florentina Garcia de Queiroz. Estava com dois anos de idade quando seu pai ateou fogo na sua residência, estava ele no berço quando foi salvo pelo seu avô materno, Manoel Garcia de Queiroz. Esse deslize mental de seu pai mudou seu rumo de vida para residir em Vieira e fazer sua história. Nesse local, aos vinte e seis anos, casou-se com sua prima de primeiro grau, Maria Garcia de Queiroz Sobrinha, filha de Virgílio Garcia de Queiroz.
Era a década de 1920, nesses anos de 1928/29, foram abertas diversas estradas na base da enxada, entre a principal a Friburgo-Teresópolis. Hoje RJ 130. O primeiro carro a trafegar após a inauguração, fora no seu casamento, ali no 3° distrito. Iniciou nessa localidade a sua luta de lavrador e negociante de gado e terras.
 Hábil, inteligente negociante, corretor, podemos afirmar que foi um dos importantes moradores dessa região que deu impulso e desenvolvimento nesse local. Muitos lotes foram negociados e vendidos para pessoas que aqui vieram a residir, que ilustraram e deram impulso a esse distrito. Foram muitas as lavouras plantadas e cultivadas por sua administração, entre as quais: batata inglesa, feijão, milho e um pouco de marmelo, já em fins de épocas.
Falando desse senhor, queremos dizer que em Vieira deixou sua marca através de seus descendentes, que são muitos. Todos preservando e enaltecendo sua memória de empreendedor, desbravador e incentivador da região.
Na década de 1930, passando por aqui um casal de suíços, com a intenção de adquirir terras para a construção de um hotel, foram influenciados a comprar em Vieira uma grande área de terra através de sua estimável habilidade de vendedor.
Anfrísio Pedro da Costa foi negociante, agricultor, conselheiro. Durante muitos anos teve patente de comissário com autoridade de delegado, mas sempre escondeu essa patente por motivo de achar que não seria bem-vindo. Somente foi declarado após seu falecimento. Nem seus filhos eram informados de tal documento como autoridade civil, nomeado. Foi um grande incentivador e presidente do Vieira Futebol Clube. Ajudou sua comunidade a construir a antiga Igreja de Santa Luzia na década de 1930. Foram inúmeras ajudas nesse local, poderíamos citar muitas outras, mas o que falamos já um pouco para relatar de sua trajetória nesse local. Anfrísio Pedro da Costa, também descendente direto dos Garcia de Queiroz, que fez sua história bonita e com sucesso e deixou uma bonita história de vida.

Fotografia dos anos de 1940. Anfrísio, sua esposa e um dos filhos.


Luís Mico

 No ano de 1846 nascia Luís Mico, um negrinho que foi ganho de presente pelo senhor Jacinto Garcia de Queiroz. Esse negrinho que foi criado pelo seu senhor como da família. Arranjaram-no uma ama de leite que o amamentou e o fez crescer. Dormia no canto da cama do então poderoso senhor dos escravos.
O tempo foi passando e o Luís Mico foi ficando um belo negro esbelto, forte e ativo. Não era tratado como escravo; era pau-pra-toda-obra do seu senhor. Naquela época de 1866, já era requisitado para ser reprodutor, por ser um negro esbelto, forte e de canela fina. Alguém até manifestava o desejo de comprá-lo, mas nunca estava à venda.
Com apenas um chamado ali estava o Luís para fazer todas as tarefas que lhe eram incumbidas. Anos passaram e a idade do seu senhor mostraria o seu cansaço, e cada vez mais o Luís se dedicava ao seu pai branco e senhor. Nos fins de semana o Lúís, com os seus vinte e dois anos, era liberado para dar seus passeios nas outras senzalas por aquelas regiões ali existentes. Apresentava-se muito bem vestido e calçado, parecendo um príncipe negro. Era recebido com toda hospitalidade e carinho. Sua juventude o ajudava nas suas conquistas amorosas e por isso deixou muitos descendentes, que eram chamados pelos meus tios avós de irmãos, e que na década de 1950 fui testemunha ocular ao conhecer diversos filhos e descendentes já bem idosos; dentre os quais Madalena, Aninha, Fostino, Leopoldino e tantos outros.
Quero ressaltar que a escravidão foi um fato consumado vergonhoso, covarde, triste e doloroso. mas nem todos os senhores eram carrascos assassinos dos negros tão sofridos. Alguns tinham atos de humanismo, fraternidade, respeito e amizade; e o senhor dessa família Garcia de Queiroz deixou uma história a ser transmitida aos seus descendentes, falada por muitos anos da sua bondade e tolerância.
Retornando à história, como relatei, o tempo foi passando e Luís nunca havia levado uma chibatada, somente era chamado para fazer seus serviços normalmente. Numa certa ocasião, o seu senhor, aprontando-se para uma longa viagem, exclamou:
_Lúís, vamos viajar alguns dias, prepare os burros e todos os pertences necessários que vamos sair bem cedinho amanhã
E assim foi feita toda a arrumação da viagem.
Já nessa época o senhor estava mais ou menos com 66 ou 67 anos de idade, dependendo de mais ajuda e atenção.
No dia seguinte partiram da localidade de Vieira para seu destino planejado.
Viajando o dia inteiro, percorrido aproximadamente cinquenta quilômetros, chegaram à tardinha em uma fazenda de muitos escravos conhecida no município de Nova Friburgo. Estavam cansados e o senhor foi dizendo:
_Luís, você vai ficar na senzala que eu dormirei na casa do amigo. E assim se fez o desejado como era de costume naquela época de escravidão.
O senhor alertou o jovem Luís:
_Amanhã me acorde cedo com os animais já arriados, prontos para prosseguirmos a viagem. Não se esqueça.
_Sim, senhor, estarei pronto.
Ficando à noite na senzala, Luís entrou na comemoração de dia de santo que era festejado.

Ao amanhecer o dia, já lá pelas oito horas da manhã, o senhor percebeu que o Luís não teria feito o seu pedido. Perdeu sua hora de levantar e em vez de o Luís acordar o senhor, foi o senhor que foi acordar o Luís. Chegando à senzala o senhor
 perguntou:
 _Perdeu a hora, Luís? Cadê os cavalos arriados?


Descendente de Luís Mico








Então o Luís saiu correndo para pegar os animais e fazer o prometido. Partiram novamente seguindo o rumo desejado; mas o Luís sempre com sono cambaleando em cima do animal. Quando chegava numa porteira, Luís com muito sono, por ter dançado a noite inteira, o senhor que o chamava para abrir a porteira. E foi durante todo o percurso daquele dia que o senhor teve que o chamar para abrir as porteiras.
Lá pela quinta porteira o nervosismo tomou conta do seu senhor, e o Luís cambaleando em cima do cavalo. O senhor falou rigorosamente:
_Já não te falei, Luís? Presta atenção! _ e o senhor lhe deu uma chibatada.
Aquele ocorrido mudou o rumo da história para quem deu a chibatada e para quem levou. Os dois começaram a chorar pelo fato ocorrido. O Luís disse:
_Desculpe! Isso não vai mais acontecer! Estou muito errado com o senhorzinho.
_Perdoe-me, Luís! Perdi a cabeça com você. Não irei mais repetir tal arrogância.
Aquele momento foi um marco onde mostrou o amor, o respeito e consideração um pelo outro, embora de uma maneira um pouco trágica... Assim era naquela época.


Neste relato que quando criança ouviu falar, após quase sessenta anos, quero dizer que Deus fez o homem negro, branco e a ele deu o direito de escolher seu destino; mas que seja de uma maneira passiva e bondosa, fazendo um mundo melhor.
Poucos anos depois do acontecido o senhor Queiroz morreu e o negro Luís Daniel viveu por muitos anos e deixou uma grande descendência em Vieira, Bonsucesso e diversos distritos de Teresópolis e Friburgo. Aqui foi copiado o dia do seu sepultamento, o apelidado Luís Mico. Este relato é um recibo desse dia:


“Leopoldino Luís Daniel pagou a quantia de dezesseis mil réis do enterro de seu pai Luís Daniel com noventa e seis anos de idade, falecido em 2 de dezembro de 1942.”
 naquela época.





Como surgiu o Hotel São Moritz


Quando nos anos de 1930, a Segunda Grande Guerra já destruía a Europa, o suíço Arthur Vogts e sua esposa Martha viajavam de Nova Friburgo para Teresópolis por uma pequena estrada de terra. No meio do caminho enfrentaram uma forte chuva que os impossibilitou de seguir viagem, obrigando-os a permanecer neste pequeno vilarejo conhecido como Vieira. Foram hospedados por Antônio Custódio, um comerciante local. Ali permaneceram por quatro dias, ficando encantados com a hospitalidade do povo, além da belíssima vista das montanhas que em muito lembrava sua terra natal. Através do corretor Anfrísio Pedro da Costa adquiriram uma área de terra. Os Vogts decidiram então construir um hotel e deram a este o nome de São Moritz _ em homenagem a Saint Moritz, uma aprazível comuna no Cantão suíço dos Grisões.





Funcionários do Hotel São Moritz, ao lado direito a primeira proprietária do hotel.




O hotel, de dezesseis quartos, foi inaugurado em oito de janeiro de 1944, com uma corrida de cavalos no seu entorno,conforme tradição em sua Saint Moritz natal, e com presença do militar e político Ernani do Amaral Peixoto.
Nos primeiros anos, o São Moritz tinha um público composto de estrangeiros, principalmente, moradores da cidade do Rio de Janeiro, que fugiam do quente e úmido verão carioca, permanecendo por semanas. Desde essa época o hotel já recebia estrelas _ como a soprano alemã Erna Sack _ sempre recebidos com fidalguia pelo casal Vogts, que morava no hotel, e hoje conhecido como Chalé A.  

História de Vieira_ Como surgiu esse Terceiro Distrito

Jacinto Garcia de Queiroz




Nos anos de 1830 ou 1835, morava um caboclo de sobrenome Vieira que fazia tratamentos com ervas medicinais para pessoas doentes. Então quando tinha alguém enfermo, dizia-se: “Vamos lá no Vieira que ele cura!” E esse nome foi se rotulando nesse local.
O distrito de Vieira começa na Ponte da Formiga seguindo em direção ao Alto do Felício Pinto, como era chamado, hoje Alto de Vieira, na divisa de Teresópolis com Nova Friburgo. Numa extensão de nove a doze quilômetros mais ou menos. Ao norte fazendo rumo com Sumidouro, Fazenda São Bento; ao sul Boa Vida e Bonsucesso; ao leste fazendo divisa com Nova Friburgo; e ao oeste fazendo divisa com Santa Rosa e Mottas; englobando aproximadamente mais de mil alqueires de terra.
Um dos primeiros proprietários dessa vasta área de terra, chamava-se, segundo contaram, Jacinto Garcia de Queiroz, que recebeu uma concessão de terra extraída de uma sesmaria autorizada por João Luís Siqueira de Queiroz, senhor com autoridade do Império para que pudesse promover, desbravar, colonizar e desenvolver essa região inóspita e um pouco selvagem.
Onde promovia o desenvolvimento dessa região com sede na Fazenda Vista Alegre. Esse senhor, Garcia de Queiroz, ao receber essa concessão veio a construir moradia nos arredores de terras de herdeiros de Antônio Custódio, ao norte do Rio Formiga distanciada da margem mais ou menos trezentos metros.
O desmatamento teve início nos arredores de sua residência descendo na vazão do Rio Formiga até no restaurante Linguiça do Padre. Seguindo a leste, nas margens do Rio Formiga, em sentido à nascente, acima do hotel São Moritiz, ultrapassando um pouco a Praça Cruzeiro.
Ao decorrer dos anos, ao serem divididas seguiram em outros ramais como Rua dos Ipês, hoje Imperial, também Rua dos Canudos, seguindo em direção a São Bento. Em sentido oeste, também Calado e Serra do Palmital, etc.
Lá pelos anos de 1870, Vieira foi dividida para cinco herdeiros, entre os quais: Modesto Garcia de Queiroz, Manoel Garcia de Queiroz, Antônio Garcia de Queiroz e duas irmãs que venderam seus direitos e foram se estabelecer na região de Nova Friburgo, na cidade e regiões de Bom Jardim, segundo contam.
Ficando três da família no local, a Fazenda Vieira ficou para Modesto Garcia de Queiroz; Manoel Garcia de Queiroz, Fazenda Sertão; e Antônio Garcia de Queiroz, Fazenda Palmital. E as duas partes que foram transferidas para terceiros ficaram no sentido abaixo do restaurante Linguiça do Padre até na Ponte da Formiga, seguindo na estrada da buracada, em direção a São Bento fazendo vertente com Independente de Mottas.
Falando um pouco das origens dessas pessoas desbravadoras, esse primeiro senhor que adquiriu essas terras é de origem portuguesa e espanhola. Trouxe consigo diversos escravos e famílias tradicionais hoje no nosso local de sobrenome Francisco do Canto, Dias e Rosa. Pessoas com habilidades construtivas e também cultura de ensinamentos como professores. Um dos primeiros da família Canto a se estabelecer nessa região foi o pai de Marcelino Francisco do Canto; onde deixou muitos descendentes que entre as famílias Garcia e Canto tiveram diversos enlaces matrimonias.
A segunda família tradicional que veio a se estabelecer em Vieira e nas redondezas, lá pelos anos de 1870, foi a Silva da Cunha. Vindo mais da região de Nova Friburgo, de terras frias do Campo do Coelho, como era chamado; que englobavam Fazenda Mendes da Veiga, Barracão dos Mendes, Salina, São Lourenço e etc.
Pelos anos de 1890, mais ou menos, vem se estabelecer em Vieira a família de origem portuguesa, Custódio Corrêa.
Dessa época em diante, diversas outras famílias de origem italiana, alemã, suíça, portuguesa, espanhola, etc., foram adquirindo seu pedaço de terra nessa região.
Na data de 1875, aproximadamente, na região de Bonsucesso e Vieira, estabelecesse a família Gallo, Baptista Granito, Dallia, de origem italiana. São grandes os descendentes de todas as nacionalidades: Antunes Nogueira, Araújo, Magalhães, Macedo, Cândido, Pereira, Rocha, Oliveira e diversas outras.
Ao findar a primeira metade do século dezenove foi criado um decreto n° 1270, de 28 de dezembro de 1862, assinado pelo desembargador Luiz Alves Leite de Oliveira Belo, fidalgo e presidente da província do Rio de Janeiro, criando a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Ribeirão da Sebastiana, no atual local de Venda Nova, pertencendo à Nova Friburgo.
Terras de Sebastiana passou a pertencer á Teresópolis em 17/12/1901, assinado o decreto pelo governador Quintino Bocaiúva. Terras de Sebastiana englobava diversas localidades, entre as quais: Vieira, Bonsucesso, entre outras cercanias.

A partir de 1910 em diante começou a surgir pequeno comércio em Vieira, através de transportes em tropas de burros. Um dos primeiros comércios em Vieira foi do José Corrêa Leitão, português que veio a se casar com a viúva de Modesto Garcia de Queiroz. Iniciou estabelecimento em Vieira onde transferido para seu sobrinho no futuro por volta de 1917, Antônio Custódio. Também existiu nos arredores do cemitério de Vieira o comércio de Joaquim da Silva Cunha. Esse terreno do cemitério que foi doado pelo mesmo para tal necessidade.
José Corrêa Leitão, ao chegar em Vieira, sua atividade foi exclusivamente na agricultura, no plantio de marmelo, batata inglesa, feijão, milho e etc. Culturas, também, de subsistência e pequenas criações de gado e vacas leiteiras. Também animais de cela entre os quais o cruzamento de jumento com égua.
José Corrêa Leitão, ao fazer uma viagem a Portugal, trouxe o jovem Antônio e duas irmãs, Conceição e Amélia, onde no momento ficaram na cidade do Rio de Janeiro. Chegando aqui no Rio de Janeiro, Antônio Custódio veio visitar a fazenda de seu tio José Corrêa, onde encontrou sua prima Petronílea, então começou o namoro; que no futuro se concretizou em matrimônio.
Nessa época de 1917 em diante, veio assumir uma parte da fazenda do seu tio, onde também construiu o primeiro comércio em geral, usando o transporte através de animais_ tropas de burros. Entre as viagens para abastecer seu comércio viajavam para Sumidouro, Nova Friburgo ou à cidade de Teresópolis. Um dos grandes incentivadores foi o José Francisco Lippi, italiano, de Venda Nova, onde era um grande comerciante que vendia muitos excedentes de mercadorias para Antônio Custódio. Daí em diante, nas décadas de 1920 e adiante, foi prosperando o seu comércio e fazendo o lugar crescer também. Vendendo de tudo um pouco, dando crédito para aquela comunidade que até então não tinha acesso a certas mercadorias. Esse comércio tornou-se e foi vigoroso até 1966, época em que foi transferido para terceiros.

Vista panorâmica de Vieira, Pedra do Cadeado, que foi traduzido para o nome de Calado, Vieira.





Então podemos concluir que um dos marcos iniciais desse distrito de Vieira foi o português Antônio Custódio, que influíra no desenvolvimento da região.
Tivemos Vieira antes do Hotel São Moritiz quando se falava: “Vamos passar na localidade daquela fazenda Vieira.” E depois, 1944, ao ser concluído o hotel, falava-se assim: “Vamos passar lá em Vieira onde tem aquele majestoso Hotel São Moritiz.”

Contando um pouco sobre o Antônio Custódio, na época da Segunda Guerra Mundial, as dificuldades eram imensas em todo o país; não havia trabalho para o sustento de muitas famílias, esse senhor com a sua hábil administração, promovia frentes de trabalho para abrir estradas vicinais no intuito de chegar as demais localidades: Boa Vida, Fazenda São Bento, Estrada da Buracada... E com isso ajudava na subsistência de famílias carentes.
Através desta história relatada, contada por descendentes do mesmo, vem provar a bondade e perseverança desse personagem que temos por obrigação, em memória, homenagear esse grande homem de fibra.

Outros personagens de Vieira que ajudaram a crescer e desenvolver esse distrito:

Arthur Garcia de Queiroz, fazendeiro, filho de Manoel Garcia de Queiroz (capitão da guarda nacional na época do Império).
Antônio Garcia de Queiroz, irmão de Manoel G. de Queiroz e Modesto G. de Queiroz. Deixou uma prole de dezesseis filhos. Veio a falecer no dia 16/09/1933, aos oitenta e seis anos.

quinta-feira, 14 de março de 2013

A História de um Simples Casal

Alcebíades e Irene após  meses de casados






No dia 24(vinte e quatro) de março de 1911, dentro de um quarto fechado, não muito ventilado, surge um choro de criança um pouco forte e ao mesmo tempo dizia alegremente a parteira comunicando:
_Seu Tutu! Nasceu o seu filho! É um menino muito bonito!
Arthur Garcia de Queiroz era apelidado de Tutu. Este simples fazendeiro nascido no século IXX, tinha constituído família para ser o varão de treze filhos que nasceriam com saúde.
Esperava ansioso o nascimento dessa criança, como era de costume na sala, inquieto, esperando o acontecimento. A parteira veio até a sala e disse a seu Tutu que estava tudo bem.
_Dona Cecília passa bem e o menino está sendo lavado. Logo o senhor poderá pegá-lo no colo!
Naquele momento, aquele jovem varão com os olhos azuis que se encheram de água de tanta felicidade agradecia a Deus por tudo ter ocorrido bem. Já estava planejando...
_Vou dar o nome de Alcebíades em homenagem a um grande amigo doutor que tenho em Nova Friburgo.
E assim começou a história desse garoto que logo foi apelidado de Cibidi. Aquele menino de olhos azuis e cabelos aloirados dava seus primeiros passos para a vida simples do cotidiano.
Já vinha com inclinações para pequenos fabricos de brinquedo, como carroça de boi e charretes de cavalos, sabendo que nessa época não existia carros por aquelas regiões do interior e nem estradas.
A inteligência estava a soltar da sua mente e dona Cecília, sua mãe, muito severa, sempre chamava:
_Vai lá, Cibidi, e toque o bezerro para o prender, para que possamos tirar o leite amanhã.
Já nessa altura no decorrer dos anos, outras crianças já tinham nascido e o leite era muito importante para a alimentação dos irmãos menores. Ele respondia:
_Espera um pouco mamãe, estou terminando uma carrocinha e já vou!
Aos doze anos foi a um baile de parentes e viu alguém tocar um violão e ficou maravilhado com aquele instrumento e o seu tocador. No dia seguinte, juntamente com seu irmão mais velho, Sanclair, juntaram-se e foram ao lado de sua morada e cortaram um taquaruçu _ um tipo de bambu grande nativo das nossas matas. E fabricaram um simples violão de poucas cordas e com aquelas mãos, até então pequenas, começaram a dedilhar pequenas músicas da época. Cibidi já demonstrava aptidão para fabricar coisas.
Aos seus doze anos acompanhava seu pai na lida da tropa até Nova Friburgo, cidade que até então não conhecia. Saiam de Vieira, o que dava cinquenta quilômetros ou mais, para vender seus produtos que colhiam nas lavouras.
Para ele era uma bela aventura conhecer uma cidade lá pelo ano de 1923. Conhecia coisas novas para sobressair sua mente.
Aos dezessete anos, juntamente com seu irmão muito inteligente, novamente se ajuntaram para construir uma obra maior da época, que seria um engenho de farinha _ obra difícil para dois jovens inexperientes, mas o desafio foi lançado.
Pedindo ao senhor Tutú:
_Papai, eu e Sanclair, estamos querendo fazer um engenho de farinha. O senhor nos permite?
E o velho respondeu:
_Você e Sanclair não tem sabedoria para tanta façanha na construção! Olha pra vocês! Crianças! Vocês vão perder tempo com essas ideias de construtor!
E assim começaram. Pegaram a forte junta de bois do seu pai, cortaram, puxaram madeiras nobres e estacionaram onde existia uma bela queda d’água, de onde vinha a ideia de construir o tal engenho.
Já haviam trabalhado por três dias tirando as madeiras da mata. Foi quando seu pai veio por curiosidade fiscalizar o empenho dos filhos, porque à noitinha no acolhimento do lar os dois se entenderam em voz alta sobre como iriam proceder na construção do engenho.
Vindo a cavalo na manhã do terceiro dia, seu Tutú exclamou ao ver os dois sentados em cima das toras:
_Alcebíades e Sanclair, vocês não vão trabalhar? Por que estão sentados?
Responderam após pedir a benção do pai:
_Estamos planejando, papai, para não dar nada errado! O senhor verá! Tenho certeza!
Durante meses fizeram o possível daquela obra magnífica para a época. Captações de água, canaletas, bicas, etc...
Foi quando um técnico com experiência passou e disse:
_Parabéns! Vocês estão indo muito bem!
Esse homem se chamava José Fellipi Dias _ senhor muito inteligente, acostumado com essas montagens de engenho.
Zeca Fillipi, como era chamado, encontrou-se com seu amigo Arthur.
_Seus rapazes estão fazendo melhor do que se esperava! Mas tem uma peça de moer e prensar que eles não conseguirão colocar. Fala pra eles que mês que vem eu venho pra terminar e botar pra funcionar.



Alcebíades aos vinte e três anos.





Ao chegar ao conhecimento dos rapazes essa conversa, eles responderam ao seu pai:
_Se Zeca Fillipi consegue, nós também conseguimos!
E justamente vinte dias depois estava tudo pronto e foi uma pequena festa ao concluir aquela beleza. Quando Zeca chegou já estava funcionando perfeitamente _ para sua surpresa.
O tempo ia passando e da roça Alcebíades gostava pouco. Desde rapaz ia se dedicando a fazer moinhos, ferramentas na forja, consertar carretões de bois.
No ano seguinte, em 1929 seu pai foi um dos primeiros a comprar um carro, era um Ford 1929. Para que o carro pudesse ir até sua propriedade, tiveram que construir cinco quilômetros de estrada com os próprios braços.
Justamente nos fins de semana, Alcebíades estava lá cortando pedras, fazendo bueiros e pontes de madeira _ era o que gostava.
Em 1932, rapaz formado, assistiu quando seu irmão Sanclair ser convocado para lutar na revolução contra São Paulo. Veio o medo da perda do irmão e companheiro de tantas simples obras.
Ele ficou na lida com a família. Nessa época foram feitas muitas promessas para que seu irmão querido retornasse vivo e com saúde. O destino foi a favor do apelo da família e seis meses depois o irmão voltou são e salvo. Para comemorar a volta, deram uma grande festa acompanhada de uma ladainha e o baile perdurou a noite inteira. E foi nesse baile que Cibidi começou a namorar a sua futura esposa, parenta de 2° grau, Irene Garcia do Canto. Jovem de beleza serena e olhar penetrante, grandes olhos azuis e cabelos negros um pouco cacheados. Irene, filha de Antônio Francisco do Canto e Edith Garcia do Canto _ pais severos e dedicados.
Estava ali decorrendo a história de um simples homem do interior que desposaria aquela jovem. Rapaz magro, esguio, de 1,75m.
Ao decorrer destes anos, chegou a trabalhar na empresa de ônibus como carpinteiro montador, já que naquela época os ônibus eram feitos com suportes de madeira. Todos comentavam com admiração que trabalhava na empresa de Alfredo Claussen de Sousa _ os primeiros ônibus que trafegaram nessas terras teresopolitanas.
Alcebíades, filho de fazendeiro com posses e neto de Manuel Garcia de Queiroz, capitão da guarda nacional, este foi senhor de escravos e de muitas posses, mesmo assim Alcebíades não foi marcado para ser um homem rico. Seria um simples cortador de pedras _ dado o nome de cavouqueiro (pessoa que faz cavas na pedra para cortá-las). Foi o que adotou como profissão, mas sempre fabricava moinhos a peso de águas, usinas, era muito procurado para fazer pedras de moinhos _ era difícil de construir.
O que é pedra de moinho? É redonda com uma abertura no centro, planada, muito bem adornada _ uma obra de arte!
Em toda a minha vida ocular somente conheci duas pessoas que fabricavam esse tipo de pedra _ o meu pai (Alcebíades) e um senhor espanhol por nome Henrique, vindo em 1956 para o Brasil. Quando viu meu pai, ficou admirado com sua habilidade construtiva. E teve até um pouco de aula com o amigo.
Recapitulando, voltando atrás, em 1935, Alcebíades casa com sua querida Irene e mais uma vez sua observação foi constante ao lado do seu sogro Antônio Francisco do Canto. Senhor muito inteligente, com diversas aptidões profissionais, entre as quais: Fogueteiro, armeiro, funileiro, ferramenteiro e muitas outras simples qualidades. Técnico em telégrafo, operador, construtor do mesmo na época, funcionário do estado.
Lembro-me vagamente deste vovô Canto. O outro avô, Arthur, não cheguei a conhecer. Tenho ótimas declarações de amigos que o conheceram e conviveram com ele.
Falar da esposa do meu pai é uma emoção muito forte. Oh, como foi linda a minha mãe! Que exemplo de mulher! Que força deu ao meu pai! Como ajudou a nos criar! Sou o sexto filho deste casal. Naquele forte peito mamei o seu leite maternal até os três anos.
Minha mãe, ao casar, logo engravidou, mesmo assim trabalhava bastante, porque já não tinha sua mãe e cuidava de vovô Canto e de seus irmãos mais novos; entre os quais: Hotílio, Claudionor, Iracema, Glória e Sebastião que morreu aos dezessete anos _ o que foi um grande baque para todos.
Minha mãe, muito inteligente, com sua barriga grande, começou a costurar para ajudar o meu pai. Iniciou assim uma linda parceria.

Como eu gosto de recordar...
Para sustentar suas vidas
Alcebíades cada vez mais a trabalhar
E o pão de cada dia conquistar
Fazendo obra pra aqui, obra pra lá
Moinho aqui, usina lá
Uma bicicleta philips conseguiu comprar
Para se locomover
E seus serviços terminar.

O que papai gostava de fazer nas suas folgas _ quem diria _ caçar! Às vezes ficava até três dias dentro da mata. Seu companheiro preferido era o João Guilherme, o negro amigo de confiança. Outro grande companheiro era o Abelardo Garcia.
Mas voltando um pouco, na época que casou, foi presenteado com uma simples casa antiga de pau-a-pique. Essa casa rústica da época, já estava à declinar. Encravada a beira de uma montanha no meio da fazenda Palmital _ um pedaço de terra que era de um tio avô meu, o nome dele, desculpe-me falar, é porque sou um pouco bobo, é então: Eduardo Francisco do Canto, irmão de vovô Canto.
Esse pedaço de terra foi comprado por vovô Tutu, Cibidi pegou de presente. Aprumou e puxou a casa que tinha quarenta anos de existência. Afirmou, rebocou a cozinha de pau-a-pique e ali na beira do córrego também havia um moinho desativado _ endireitou-o e ativou-o com aquelas águas cristalinas da Serra do Calado. Foi a primeira luta para si e sua esposa.
A vida rural naquela época era muito diferente da de hoje. Precisava de crédito para fazer suas compras de comestíveis, querosene para iluminar seu belo rancho.
E não poderia deixar de citar um dos primeiros homens que abriu os braços e as portas para o meu pai. Grande homem, comerciante, bom, honesto, perseverante e bondoso. O português Antônio Custódio, amigo de todos e principalmente da nossa família. Como ficamos devendo a esse homem notável!

A luta continuava e um ano depois do casamento, minha mãe e meu pai foram agraciados com o nascimento de sua primeira filha. Como não deveria ser muito diferente do seu nascimento, agora vinte e seis anos mais tarde era o choro de sua primeira filha que se ouvia, da mesma maneira a parteira falou em voz alta:
_Cibidi, é uma bela menina, sim!
A parteira era a dona Nair. Uma mulher de fibra que viria a acompanhar todos os nascimentos de seis filhos do casal. Como ficamos devendo a essa forte mulher! Temos a obrigação de lembrar!
Mamãe passava bem, tudo ocorrera ótimo e refletiam nos olhos de papai a alegria. Talvez até pensasse que poderia ser um garoto para o acompanhar, mas não... era uma menina. Por quê? Deus é sábio na sua escolha de sabedoria. Quantas dificuldades viriam pela frente... Futuramente aquela menina bonita e sapeca, daria muita alegria para minha mãe sofrida e já calejada da vida.
_Como será o seu nome? _ perguntou mamãe.
Papai respondeu:
_Se fosse um garoto, Irene, eu daria o nome de Bennes, mas como é menina dê você o nome que melhor venha a refletir.
Minha mãe não poderia deixar de pensar:
_Vou dar o mesmo nome da minha irmã querida, Démpina.
Que nome estranho para muitos, mas para nós não. Que lindo, que majestoso, que reflexão!
Vovô Tutu foi visitar. Como ficou alegre, afinal era sua primeira neta! Novamente aqueles olhos azuis, já um pouco cansados pela idade, que há vinte e seis anos se encheram de água de alegria, voltavam a transbordar novamente.
A luta do casal agora era maior. Uma filha pra cuidar, um moinho para olhar e sempre a movimentar. Mamãe lutava enquanto papai ia longe trabalhar, suas obras completar.
Como era dificultosa a profissão que meu pai escolheu _ cavouqueiro(cortador de pedras. Pessoa que faz cavas na pedra para cortá-la).
Em meados de 1932, um casal suíço se encantou com a beleza da nossa região. Adorou nosso povo hospitaleiro. Comprou uma grande área de terra nesta localidade de Vieira.
Para que pudesse construir um majestoso hotel, precisava de patacões de pedras para fazer o alicerce do mesmo. Contratou pessoas e foi quando precisou de um homem inteligente... Procurou Alcebíades. Não sabendo ainda o suficiente para aquela atividade, mesmo assim ele se prontificou a dar inicio ao trabalho de cortar as tais matações(pedra solta,grande e arredondada). Por sorte veio para iluminar, um português já profissional na área de pedreira e ferreiro apontador. Não demorou a ser um profissional. Encantou-se com aquela simples e dificultosa profissão. Tão difícil que quando com o calor do sol, chegava a 50°C, quando frio, abaixava até 8°C. Era preciso forrar com estopas de sacos para poder sentar sobre o granito para cortá-las.
O estourar da pedra grande saindo das mãos calejadas de Alcebíades era fantástico. Quanta admiração dos seus amigos e conhecidos ao presenciar tal feito em uma profissão milenar. Quero lembrar aqui, não só pelo meu pai, mas por muitos outros amigos profissionais que nessa labuta deram seu suor. Quantas pequenas casas foram construídas, castelos majestosos e deslumbrantes foram desse início! Já vi uma frase dizer assim: “Com as pedras que me atirarem, construirei o meu castelo.”
Cibidi pensava assim: “Cada pedra que corto, ajudarei a construir sua morada.”
O Hotel São Morithiz, belo e majestoso de alicerces de pedra, perdura até hoje e por muitos anos creio que estará lá como prova ocular da história tanto desse homem como de tantos outros que deram seu suor para fazê-lo belo e com segurança; acolhendo seus visitantes nobres e ilustres que por aqui se hospedaram. Dando trabalho honesto a tantas pessoas que ganham seu sustento para suas famílias. Que prazer nos traz! Que Deus o ilumine e descanse em paz esse casal de suíços, que teve essa brilhante ideia! Ousado e perseverante, porque viu nesse lugar uma beleza inconfundível de povo humilde, hospitaleiro e trabalhador.

O tempo passa rápido e dona Irene está prestes a ganhar o segundo filho. Alcebíades trabalha, nem tem mais tempo para suas caçadas. Agora seriam dois filhos... mas, não! Eram três! Como assim... Três?
Porque a bondade de papai e de mamãe era enorme. A próxima filha era a Mariete, adotiva, filha de David Garcia de Queiroz. Grande amigo e primo também muito querido. Essa menina chegou aos vinte dias de nascida para o acolhimento daquele simples lar. Órfã da mãe, porém encontrou outra mãe que quatro anos depois estava prestes a dar à luz! Sim... Como é bom lembrar desse fato.
Novamente naquele recinto, numa noite linda e estrelada, dona Nair anunciou:
_Vamos começar o parto, Cibidi! Fique atento! Dê-me tudo o que preciso! Bacia,água morna e toalhas.
Aquele homem estava atento a tal acontecimento. Não demorou muito e o choro forte de uma criança abafava os ruídos dos grilos. Era outra menina linda de cabelos loiros como o ouro e os olhos verdes como a mata de nossa terra. Agora meu pai pensou: “Uma de olhos azuis. Uma outra que me presenteou meu compadre. Que beleza! Outra de olhos verdes!
Dona Nair, que bela parteira, como devemos a sua pessoa! Que esteja no mais alto pedestal ao lado do Senhor.
_Ainda não foi um garoto _ Irene disse.
_Temos muito tempo pra pensar nisso! _ Alcebíades respondeu.
_ Como vai ser o seu nome?
_Se fosse garoto seu nome seria Bennes. Como é uma menina escolha o nome você! _ papai falou.
_ Então será Zenáide!
_Que belo! É nome francês ou suíço! _ papai argumentou _ Gostei. Que beleza!
E assim a família vinha de vento em poupa. Também as lutas eram maiores para se alimentar. Naquele período não havia bolsa família, vale gás ou cesta básica. Saía dos braços e do suor o sustento.
Vovô Arthur já estava ficando velho. O fazendeiro que era não tinha mais forças como antes. Sendo pai de treze filhos, não poderia ajudar tantos.
Quero lembrar quantas vezes papai me relatava: “Tive muitas dificuldades, mas tive muitas ajudas e apoio dos meus amigos, irmãos... Sanclair, Ascendino... Como me apoiaram! Como me estenderam a mão! Que amizade forte tenho! Com Cinézio conversei muito. Meu cunhado, compadre Maurino, quantas mandiocas me deram! Tio Ademar sempre me visitando... Minhas irmãs _ quanto apoio me deram... Leonel; que moleque bom ele era! E Vidal? Belo menino. Temos que ficar de olho pois não tem muita saúde.”
No decorrer desta história relatei sobre muitos amigos de meu pai. Também por força da memória vou contar apenas uma desavença que pude um pouco presenciar.
O tempo não para _ a boca come cada vez mais. Daí? Como fazer? Trabalhar mais, comprar tudo, pensar em todas as necessidades.
De tempos em tempos Alcebíades se ajuntava com Belardo ou Lucíndio nas suas folgas. Lucíndio e Alcebíades caçavam em São Bento, uma região de Sumidouro. Em outras vezes, Cibidi, juntava-se com o negro João Guilherme e faziam a mesma façanha. Contando sua história de caçada meu pai relatou:
_Meu filho, passei um sufoco muito grande nas matas de São Bento!
_O que foi, papai?
_A gente caçava nas matas do São Bento, mas lá era proibido pelo doutor José. O fazendeiro proibia. Porém eu e João Guilherme fomos mesmo assim! Quem toma conta de lá é seu Damázio. Homem grande, forte e corajoso. Após termos matado dois jacus em frente ao fogo nos propomos a depená-los. Foi quando escutamos os tropéus dos passos daquele encarregado. Era ele mesmo! Ele chegou com dois grandes cachorros, uma espingarda nas costas e uma garrucha na cinta. Ao chegar ficamos em prontidão. Ele chegou sereno e calmo como uma dama. Não demonstrava medo de nada. Nós, sim, estávamos quase borrando as calças! Aproximou-se e cumprimentou-nos calmamente. Seus cachorros nos olhavam com atenção. Ele falou: “Vocês não sabem que é proibido caçar aqui?” _ Sim, eu sei, seu Damázio! _ eu respondi. “Então porque fizeram essa contra-ordem?” _ disse o Damázio _ O negro João ia falar quando ele retrucou: “Fica quieto, aí, negro, estou falando com o Alcebíades por enquanto!” _ Ele já me conhecia de longos anos.
Pedi desculpas ao seu Damázio.
_É que erramos o caminho e também não o encontramos!
Damázio me deu uma pequena descascada de conversa e perguntou ao João:
_Você, negro sem ordem, eu nunca vi um macaco querer caçar outro!
Na hora me pus a rir, porque quando falou aquilo já estava brincando.
Aquele incidente foi resolvido passivamente e o Damázio concluiu:
_Alcebíades, não cace sem ordens minhas! Quando quiser caçar venha até min!
Estava ele mais do que certo. Eu me rendi ao seu direito e a sua lealdade de comandado e agradeci muito. Outras vezes pra lá fui! _ contou meu pai.
Ao chegar a casa ele contou o acontecimento para Irene. Ela lhe deu uma descascada.
_Pense bem, Alcebíades! Você tem família pra cuidar! Pense nos seus filhos, homem de Deus!!!
Foi uma lição pra mim. Vi muitas coisas naquele momento acima do nosso pensamento.
Agora aquele homem magro por natureza estava maduro, calejado da vida e do rumo o qual estava tomando. A luta não parava. As meninas davam seus passos. Eram esplêndidas! Démpina com 8 anos, Marinete com 6 e Zenaide com 4 anos. Um belo trio feminino. Já estavam dando uma ajudinha à mamãe _ jovem e sofrida pelo destino que Deus lhe determinou.
 




Alcebíades e Irene na estrada de vovô Canto, perto de sua casa.





As surpresas não paravam por aí! Naquele corpo forte de mulher parideira, de sangue quente e ossos fortes, vinha mais um ser vivo. Felicidade! Só que para mais um ser, maior a luta. Era maior a responsabilidade. Nem por isso a lei da natureza deixava de ser mais forte e também o amor daquele casal.
Em 1945, época muito difícil, por causa da segunda guerra mundial, o mundo estava em clima de medo; as notícias não eram nada boas para a política do Brasil. Entretanto sempre ouso dizer: “Depois da tempestade vem a bonança.”
Os preparos foram iniciados para o nascimento do próximo filho. Em uma madrugada chuvosa de 19 de dezembro de 1945, sai meu pai apressado para buscar novamente aquela que nos ajudou a nascer _ dona Nair; essa senhora forte e com fartos conhecimentos de parteira, não deixaria de atender aquele chamado de seus amigos e parentes.


Ainda com lama nos pés, chegou e foi entrando casa adentro. Logo ordenou que lhe trouxessem água morna, toalhas... As três meninas ficaram alerta: Vamos ter um irmãozinho! Vamos ajudar!
Naquele quarto iluminado por Deus, a lamparina de querosene dava o seu fosco brilho esfumaçado. Dona Nair pediu a seu Alcebíades mais luz para que pudesse trazer a criança à luz, que ela pudesse ver a luz do dia nascer.
As meninas faziam barulho e conversavam:
_Eu vou pegar no colo primeiro!
_Não! Eu vou!
_Não! Serei eu!
Quando o choro forte veio a calar todas aquelas garotinhas, Alcebíades ali estava no canto da sala. Quieto e com a boca seca de curiosidade _ Será um menino?
Dona Nair falou mais forte:
_Alcebíades! Alcebíades! É um molecão! Venha ver!
O menino estava lavado e enrolado num lençol. Meu pai entrou no quarto estonteante de tanta emoção. Pegou-o no colo, mamãe sorria.
_Aí está o filho que você tanto esperava, Cibidi! _ ela exclamou.
O casal sentiu junto a emoção naquele instante. As meninas pulavam a todo o momento, festejando o acontecido. Tinha vindo ao mundo para felicidade do casal e de muitos ao decorrer dos anos: Bennes.
Ao amanhecer a chuva acabou e no clarear daquelas belas montanhas da Fazenda Palmital a vida continuava e as bocas não paravam de vir.


A bicicleta philips de Alcebíades tinha de rodar, porém todos foram avisados, inclusive vovô Canto. Bem lá encima no sertão, o suor caia do rosto de vovô Tutu. Ele tentava descer aquelas ladeiras.
Avisados estavam vovô Tutu e vovó Cecília. Todos felizes compartilharam suas ajudas. Vovó Cecília pegou uma galinha, Cinézio pegou ovos. As irmãs comentavam:
_O primeiro sobrinho! Que bacana! Quando será nossa vez?
Vovó retrucava:
_Deixem de ser bobas, meninas!
Falar de vovó Cecília é um grande prazer. Como ilustra este relato de seu neto! Descendente humilde e pacato. Essa senhora contribuiu tanto para sua família! Severa, nem sempre chorava, entretanto suas atitudes demonstravam sentimentos bondosos... De fazer o mundo melhor... Estenda suas mãos fazendo caminhar alguém. Este alguém será um simples corrimão para os anciões que seremos um dia.
Dia dezenove de dezembro era um sábado. No domingo todos os familiares foram visitar o recém-nascido. Todas as felicidades para o bebê.
Segunda-feira foi novamente Alcebíades para o trabalho. Claro que alguém ficou no resguardo de mamãe. As meninas sorriam felizes e já tinham segurado Bennes no colo. O vinho era pouco, mas o café com bolinhos não faltava para as visitas.
Passa o tempo e papai começava a sentir o peso da despesa. Quatro crianças para sustentar, vestir e calçar. Naquele tempo uma hora era sandália, outra hora era tamanco, mesmo.
Chegando a casa à noitinha, papai juntamente com mamãe, conversando diziam:
_Vamos dar para Bemério e Margarida batizarem o menino! Gostamos muito deles!
O ano de 1948 findou e novo ano veio clarear melhor o mundo.
Alcebíades foi chamado para trabalhar em Bonsucesso na casa de um grande amigo. Este era casado com uma prima de 2° grau. A philips não o deixava na mão.
Bem cedinho estava a bater palmas na residência do senhor João Dias da Rosa. Homem sério e trabalhador. Logo Cibidi foi recebido para forrar o estômago com bolinhos de fubá frito.
Durante alguns dias o moinho foi reformado. O milho era moído, então. João ficou feliz com seu conserto e ali apresentou seu filho que estava de passagem.
_Este é meu filho, o Irineu!
Os cumprimentos foram dados. A partir daí mais um laço de amizade daquelas pessoas interioranas foi feito. Os laços de amizade de meu pai com o João não era por acaso. Vovô Tútu sempre estava a lidar muito antes de papai nascer, com o velho avô do Irineu. Eram amigos tropeiros e aqui terei tempo de relatar amizades de três gerações ao decorrer de mais de oitenta anos.
Nossas famílias se cruzavam e as gentilezas de ambas as partes eram grandiosas. Família Dias da Rosa, tradicional de Bonsucesso, vinha de uma descendência humilde. Vindo há mais de oitenta anos atrás com a família Canto e Garcia para desbravar aquelas terras e matas virgens da região.
O Irineu se candidatou a vereador. “É nosso candidato!”_ disse vovô Tutu _ Meu avô notava o valor daquele rapaz de estatura mediana, gestos calmos e palavras pensadas. Falando dos seus projetos juntamente com o seu futuro prefeito.
A família Garcia de Queiroz depositou toda a sua confiança votando no jovem rapaz. Quanta felicidade para todos! A vitória do Irineu foi expressiva e de seu amigo prefeito também.
Com o passar dos anos, Vieira recebeu muitos trabalhos de abertura de estradas. Aquele senhor sorria cada vez que aparecia um trator para alargar as precárias estradas feitas com as mãos. Novamente irão precisar reformar bueiros e pontes. A união do povo era bonita de se ver! O trator na frente... Pela primeira vez o lavrador assistia a força motriz daquela máquina. Vovô pronunciava:
_Vamos lá, rapazes! Alcebíades e Sanclair! Vão fazer os bueiros que quero abrir estrada até o sertão, até na casa de Ascendino _ Ali estavam padrinho, Ascendino, Cinézio, Leonel e o rapaz Vidal pulando de alegria.
Como era bom ver novidades de desenvolvimento! As foices eram amoladas nas pedras. Provindas de Minas, roçavam as beiras das ruas. A comunidade se reunia para melhorar aquele pedaço de chão esquecido pelo tempo.
É bom relatar o que me foi passado. Como meus antepassados davam valor ao seu pedaço de terra! Deus nos fez nascer da terra e para a terra iremos! Tenha certeza, o desafio para Alcebíades não terminava naqueles tempos! Filhos vinham logo a seguir. As famílias cresciam para popular as serras caladas de Vieira.
Em breve nascia Ailton no dia 1° de abril. Dia da mentira, mas não era mentira; a criança estava ali forte e saudável.
A luta de mamãe era maior. Papai com sua phillips corria. Mais trabalho agora foi desencadeado.
Ailton seria o companheiro de papai. Acompanhando-o e dando apoio ao velho nas suas caçadas.
Moramos na primeira casa que meu pai consertou no Calado. Viria a morar na antiga casa de vovô Canto, mais perto do arraial de Vieira. A ideia de papai agora era construir um moinho e um engenho de farinha nesse sítio onde existia mais água.
Ali foi uma luta constante para meus pais. Não era fácil cuidar dos filhos, olhar vovô já bem idoso e também dar guarida aos irmãos mais jovens.
A máquina de costura não para e o moinho tem que moer milho porque as crianças pulam, pulam e a boca também não para. A phillips cada vez mais longe tem de ir levando aquele corpo malhado pela necessidade de seu sustento.


O tiro errado, o susto da perda, a marca do sangue... Que triste acontecimento!

Sendo papai um ótimo atirador, ensinou minha mãe a dar uns tiros de vez em quando. Certo dia mamãe falou:
_Alcebíades, tem um gato do mato comendo os franguinhos. De-me a espingarda que vou dar um jeito nele!
Assim foi feito e pai deixou a arma num lugar que ela pudesse ter acesso.
De mão na espingarda, ela teve a ideia de atirar em um alvo entre um pé de jabuticabas bem enfolharado, quase madurando os frutos.
No alvo, a certa distância, o tiro foi disparado e um forte gemido soou estrondoso.
_Ei! Me acertou aqui!
O jovem Claudionor estava chupando suas frutas quando o tiro de raspão nele atingiu. Todos correram para o pé de jabuticaba. O jovem estava pálido como a palha do milho e com alguns chumbos no braço a gritar de dor.
Minha mãe ficou fora de si. Desmaiou e passou mal. Sentiu mais dor do que a própria vítima. Depois daquele incidente nunca mais pôs suas habilidosas mãos em armas de fogo!


O irmão lutador e amigo de pai, Ascendino, mudou-se e outros irmãos também se distanciavam. Aquela união que ali se compartilhava ia ficando mais longe. Era um desafio sair do interior e montar negócio na cidade... Assim foi Ascendino, querido irmão, na época casado há poucos anos.

Tendo já vovô Tútu comprado uma modesta casa na cidade, mais precisamente na rua Bela no Vale do Paraíso; pra aonde foi, também, Ascendino com sua esposa Maria e seus filhos pequenos.
Ascendino fez uma sociedade com seu sogro, Neca Cunha. Homem trabalhador e por que não dizer: Inventor de máquinas em diversas modalidades? Baixo, de procedimentos severos e honestos.
O moinho de fubá tocado à eletricidade foi montado. Era diferente do nosso moinho de roça que era tocado a força d’água e moía apenas sessenta ou setenta quilos dia e noite. O moinho elétrico era a indústria poderosa que aparecia para fortalecer o país. Fabricava cinquenta sacos por dia. Quê diferença!

O destino estava selado para Alcebíades. Esse irmão novamente lhe estenderia a mão como prova de seu amor e da união da família. Um irmão! Homem batalhador!
Ascendino tinha os olhos azuis pequenos, um pouco estrábicos, mas Deus escreve certo por linhas tortas... Seu olhar era de águia! Tinha visão dos tempos. Viria a se destacar junto a sua família. O quanto era inteligente e admirado por todos!
E agora Alcebíades aqui e Ascendino lá! Tão longe para se comunicar! Mas o tempo não para, a boca come e a bicicleta phillips rodava mais e mais. E vem outro aí! Sim, outra criança!
Não! Agora tem que dar uma freada. Tá descarrilando o trem? Que nada! Para felicidade de todos, o trem voltou aos trilhos. O dedo do Senhor apontou para o seu lugar. E vamos saber com alegria esse fato.
No dia do aniversário de Bennes, naquela tarde quente de verão, as coisas já estavam prontas e a noite chegava. As mocinhas pulam e dançam. Démpina pôs até o batom de tia Iracema, Zenáide caprichou no cabelo e Mariete botou aquele humilde sapato brilhoso.
Era festa, sim, como não poderia ser? O nascimento de um ser é sempre uma festa!
Bennes falava:
_Irmãos fazem aniversário juntos.
Agora aquele quarto não era iluminado com lamparina. A usina elétrica do vovô Canto foi ligada para iluminar a velha casa. Quanto trabalho meu vovô Canto e papai tiveram naquela usina! Tocada a água... Funcionava muito bem...
Sete horas da noite Bennes já estava brincando com os seus carrinhos de lata que vovô Canto lhe deu de presente neste dia do seu aniversário. Ailton estava ali, vai pra lá, vem pra cá. Belo alvoroço!
Na cama mamãe se contorce: “Cadê dona Nair?”
E papai vem chegando. O cachorro late dando o aviso. Mas tinha cachorro também? Claro! Não poderia deixar de me recordar desse fiel cão chamado Jaú, que muito nos equilibrou para que pudéssemos dar os primeiros passos.
Ruídos do passar daquela senhora parteira. Pontualidade! Quanta dedicação para conosco!
A ordem foi dada _ bacia de água quente, toalhas... _ Todos esperavam na sala assoalhada. Fazendo algum barulho quando disse:
_È um garoto!
A criança chora dentro da bacia. Dona Irene agora falava:
_Vou dar o nome daquele atencioso médico de Nova Friburgo... Tadir será o seu nome!


O começo de um triste desentendimento...

O molho de nabo _ certa desavença sem precedentes. Que triste, que transtorno! Um fato que iria mudar o rumo daquele casal. Futuramente um desentendimento entre minha mãe e seu irmão quase terminou em tragédia.
A necessidade de alimento era grande, como não alimentar tantas crianças? Tudo o que tínhamos a volta eram legumes e frutas. Seria mais do que necessário o dinheiro que papai ganhava como cortador de pedras e construtor de diversas pequenas obras. Já não estava dando o suficiente para manter a casa. O salário era minguado. Minha mãe trabalhava, lutava, costurava, fazia horta... Até terno de casamento fabricava para ganhar um pouco a mais, entretanto ainda não era o bastante para tantas crianças.
Certo dia chamando ao seu irmão pediu:
_Cláudio, vá até aquela lavoura de nabos do Flávio e me traga um pouco para o almoço!
Esse molho de nabo foi o preço por muitos anos e muitos anos de brigas sem precedentes. Quanta falta de compreensão de ambas as partes!
Cláudio não encontra seu irmão que era compadre de meu pai e minha mãe. Quem poderia atender? Aquele tio do mesmo sangue iria fazer o desaforo de não compreender as necessidades de sua irmã? Ela tanto sofria e batalhava para colher precariamente certos alimentos para seus filhos... Os nabos já estavam nas mãos do tio Cláudio e ao passar em um trilho, encontrando com seu irmão, veio a indagação:
_Quem lhe deu ordem para tal feito?
Cláudio, rapaz novo, sem experiência, respondeu que pegou na confiança de que tinha no seu irmão. A resposta foi categórica e dura:
_Fala pra Irene que eles não moram encima de pedras! Que plantem pra colher!
Oh, meu Deus! A semente da discórdia foi semeada. Chegando com os tais nabos, o acontecido foi relatado para minha mãe. Dona Irene, sangue quente, e talvez naquele momento de necessidade, o troco não poderia ser pior.
_Mande-o engolir isso pela boca abaixo! _ se não falou pior...
Quanta falta de experiência dos três. Os dois homens se encontraram, as ameaças foram anunciadas. Quem estava certo eu não sei... Paro por aqui, amigos.
A mágoa veio à tona. Como ouvia meus pais dizerem: “Não temos inimigos, porém Flávio não é amigo!”
Que pena pensar assim! Tio Flávio, que homem inteligente, de competência como administrador! A cerca foi estacada no rumo de nossas vidas. Tia Olívia, esposa de Flávio, era muito bondosa. Impossível não tomar partido. Aquela rixa e opinião de orgulhosos perduraram por muitos anos; impedindo a convivência com os nossos filhos maravilhosos que são agora. Vamos deixar de lado aqueles com quem não mais convivemos.
Os amigos de meu pai, tio Virgílio _ o Nhonhô, como era chamado. Também ali estava o primo e amigo David _ açougueiro. Sempre do seu lado Júlio Rosa e sua esposa Inaura. Mulatos e negros que na fazenda do meu avô Arthur nasceram. Inaura era filha de quem? Do companheiro de caçada Zé Guilherme. Como se importar com apenas uma pessoa, enquanto tenho dezenas de fiéis amigos.
Chico Dallia veio visitá-lo sabendo do acontecido. Que amigo de meu pai! Como me lembro daquele senhor que viveu até os seus noventa anos! Anos de peleja e muita labuta. Chico Dallia era descendente de negros e italianos. Bela mistura para a nossa gente forte!
Abelardo também era amigo, tio Ademar com seu cavalo Baio... Este se pôs a marchar e com um e com outro começou a conciliar.
Vovô Canto já cansado e aposentado ali por controlar : “Que entre irmãos não se briga... Nem que chova canivete.”
O tempo passa e a boca não para de comer...
A ideia começou a surgir: “Vamos para a cidade de Teresópolis com as crianças!”
_Mas que ideia, Alcebíades! _ dizia mamãe _ Se está difícil aqui, imagine lá onde teremos que comprar tudo!
_Vamos pensar nisso! Aqui não vendo lajota e meu meio fio de pedra lá vai ser muito diferente. Trabalho lá que não vai faltar!
A semente estava lançada na terra da vida.
A visita dos compadres bateu na porta. Era noite. Que surpresa... Meu tio Bemério, sua esposa Margarida e seus três filhos. Que alegria para os meus pais! Havia o apoio dos irmãos e amigos. Abraço pra aqui, beijos pra lá... E os primos, os nomes vou relatar: Arlete, Marlene e Aldete.
Elas começaram a brincar com meus irmãos e irmãs. Dempina e Mariete já mocinhas,puseram-se a comentar que teriam ido num baile dançar. Mariete ria com toda graça dos passos de dança que Dempina com medo tinha de errar.
Arlete já falava nas suas intenções de namorar. A sua irmã mais velha, sobre isso não queria falar. Zenaide estava ao lado para escutar aquelas primas e irmãs a se gabar.
O primo de Aldete ainda pequeno se pôs a comentar ao ver o carrinho de lata de Bennes a brilhar.
_Tenho um de madeira que me pus a fabricar.
Ailton e Tadir do fundo se puseram a pular. Num sentido de atenção para o seu lado puxar.
Vovô nesse instante começa a adentrar, com muita felicidade, sua benção começou a dar. Vendo todos os seus descendentes em união compartilhar...
O tempo não volta, a boca não para. O trabalho no dia seguinte os espera.
No ano de 1950 veio uma surpresa também... A chuva não para, a terra vira lama. No ventre de Irene tem história de quem contará história. Vem vida por aí.
Aqueles olhos assustados de mãe e pai da situação, começavam as preocupações.
Dezembro passa, janeiro... Muitas festas acontecem aí. Como não relatar que Dempina já estava querendo namorar? Mariete flerteia um tal de Thieres. Quem afinal? Thieres!
Ao mudar da antiga casa do Calado para o sítio de vovô Canto, através da prefeitura de Teresópolis.
Foi convidado um senhor professor para que pudesse lecionar por nome Alvinho Amorim, homem sábio para sua época. Categórico, perseverante. Foi pai de diversos filhos, entre os quais Thieres. Que amizade tivemos com essa família! Dona Cecília, sua esposa, tinha voz grossa e gestos finos, amigáveis. Que interessante... seu Alvinho falava um pouco fino e estridente e dona Cecília grosso e um pouco rouco. Como me lembro daquele professor severo e dedicado para com seus alunos. Dava aulas e nas horas vagas plantava milho, feijão e outras culturas para o seu sustento. Quantas terças de feijão e milho dividiu com meu pai! O café torrado e socado no pilão saído dos braços de dona Cecília. Que beleza! Que gostoso!
Em 1° de janeiro de 1950, na rádio, as boas vindas do ano novo eram pronunciadas. Olhando para a barriga de minha mãe, papai pensava:

_Ocorrerá muito bem o nascimento dessa criança.

Papai já tinha quase quarenta anos e mamãe trinta e quatro. Quanta luta até ali! Só estavam no meio do caminho.
_Depois desse, Alcebíades, vamos parar. Será o caçula.
Mamãe anda pouco. O peso do corpo, as pernas um pouco inchadas. Tem de ter repouso. Papai estava na labuta. Onde mais? E sua phillips, claro, ao lado do seu serviço.






Ailton,Tadir,Bennes,Dílson,Zenaide e Elza filha de Maria Corrêa. Década de 1950.






Fevereiro chegou, os dias iam passando. Vinte e três, vinte e quatro... Na noite de 24 para 25 a chuva caia fortemente. Nas cabeceiras das nascentes do Rio Formiga as pedras rolavam com força de tanta água. Na casa velha de vovô Canto, o barulho era intenso. Todos na sala quietos estavam. Agora só o barulho da chuva. Mamãe olhava para a imagem de Santa Luzia. Com seus olhos azuis grandes, pedindo uma trégua.
Ali na sala grande de vovô, tinha mais pessoas. Quem seriam elas? Como não contar? Tio Cláudio e Margarida, minha tia querida e amada, exemplo de mulher.
A chuva branda fica calma e serena. Somente as pedras do rio se debatem parecendo uma banda de música estridente.
Dona Nair, onde está? Para onde está? Teria outro lugar para ela estar? Ora, onde está? Novamente pela sensatez, as mesmas palavras fortes e decididas: “Bacia, água morna, toalhas...”
A criança estava prestes a nascer. A chuva para, vem o choro mais forte do que foi antes! Todos na sala abrem um sorriso de alívio. Dona Nair anuncia bem alto:
_Alcebíades, Alcebíades, é um molecão! Não foi fácil!
Nascera? Como era essa criança?
Branca como a neve, olhos verdes azulados, cabelos como a paina. Este viria ao mundo para contar algumas histórias. E o nome já estava escolhido. Será Dilson.
No dia seguinte tudo acontecido no quintal da velha casa. A lama ainda era intensa. Vinham Lico e Maura com toda a delicadeza pegar aquele menino branco por natureza. Falaram com carinho parecendo da nobreza. Com olhos verdes da mata, será de muita destreza para que olhe o mundo, escreva com certeza amizades. Iria fazer com toda a delicadeza apenas usando as palavras com grandeza.
A história continua quatro anos depois_ a família se muda para a cidade de Teresópolis. Vou dar uma parada para tomar um fôlego... Virá muitas surpresas futuramente e muita luta do casal. Esta primeira etapa baseada em fatos reais foi relatada através de depoimentos de pessoas amigas ligadas a família.

Dilson Garcia de Queiroz

10 de novembro de 2008